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Amai-vos uns aos outros como eu vos amei (cf. Jo 13,34)
O texto evangélico refletido no quinto Domingo da Páscoa, segundo o Evangelho de João (Jo13,31-33a.34-35), apresenta algumas características próprias da teologia da comunidade joanina. O texto, apesar da brevidade, é de grande profundidade e pode ser dividido da seguinte maneira: 1- Sinalização do rompimento definitivo de Judas com o projeto de Jesus; 2- Explicitação da glorificação de Jesus em Deus; 3- Manifestação da brevidade da presença do Mestre junto ao grupo dos discípulos; 4- O mandamento do amor deixado como testamento de Jesus.
Na descrição anterior João relata o gesto do lava-pés, compreendido como um testemunho de serviço e amor sugerido pelo Filho de Deus ao discipulado. Jesus afirma que o testemunho do grupo no mundo dar-se-ia pelo serviço prestado à humanidade: “vocês também devem lavar os pés uns dos outros. Eu dei-lhes o exemplo para que vocês façam do modo como eu fiz. Se vocês entenderem isso, serão felizes se o praticarem” (cf. Jo 13,14-15.17). É um convite inequívoco ao serviço como testemunho de amor a toda a humanidade.
Já no texto proposto para este domingo, João inicia descrevendo o sinal do rompimento definitivo de Judas com Jesus e o grupo dos discípulos através gesto de sair do cenáculo, o lugar onde acontecia a ceia. O ato de sair tem aqui a conotação mais ampla de deixar o lugar. Judas estava abandonando o grupo e a proposta. Os outros evangelistas complementam a cena posteriormente, descrevendo o ato da traição de Judas, a negociação por trinta moedas. Para este discípulo a proposta de Jesus deixou de ser significante, porque não havia comunhão entre sua perspectiva de vida e os valores do Reino anunciados por Jesus. Também podemos compreender que ele saiu porque, como traidor, não ou viver a força do amor expresso por Jesus na missão e no gesto do lava-pés.
Estava delineada a contradição. Jesus sugeria ao grupo dos discípulos servir com amor e expressou isto no gesto de lavar os pés. Judas traía porque não compreendeu a profundidade e amplitude da proposta do Mestre de Nazaré já delineada na peregrinação até Jerusalém. Traiu e saiu. Aquele não era o seu espaço. Aquela não era a sua proposta. Antes de sair ele foi denunciado pelo filho de Deus (Jo 13, 10-11).
Sem a presença da sombra da traição impetrada por Judas, Jesus revelou o seu futuro. Não seria a morte, fruto da traição de Judas, mas a glorificação, fruto do amor de Deus. Compreendemos que não significa a glória humana, mas a glória divina, dirigida de quem foi capaz de levar o amor pleno à humanidade e às últimas consequências enfrentando a cruz. O apóstolo Paulo lembra este processo na carta à Comunidade dos Filipenses. Escreve: “por isso, Deus o elevou ao posto mais alto, e lhe deu um nome que está acima de todo o nome, para que ao nome de Jesus se dobre todo o joelho nos céus, na terra, e debaixo da terra. E toda a língua confesse que Jesus Cristo é o Senhor, para glória de Deus Pai” (Fil 2,9-11). A glória de Jesus é a glória de Deus e de toda a humanidade pela doação do crucificado-ressuscitado.
Jesus também lembra a brevidade do tempo que teria com os discípulos: “filhinhos, por pouco tempo estou ainda convosco” (Jo 13,33a). É uma alusão a sua partida próxima, visto que logo seria preso e enfrentaria o calvário e a cruz. É como o grão de trigo que será colocado na terra para germinar e produzir fruto. Momentaneamente os discípulos ficariam privados da presença de Jesus, de uma relação que para eles foi importante e significativa. Experimentariam por um tempo o drama da ausência do Mestre, o vazio da morte que seria preenchido pela glória da ressurreição.
Antes da partida Jesus deixou para o grupo um valioso testamento o mandamento do amor: “eu vos dou um novo mandamento: amai-vos uns aos outros” (Jo 13,34). O mandamento é um dom, uma doação, uma grande oferta que vai orientar a vida do discipulado e ajudá-lo a ser o diferencial na sua ação no mundo.
Apresenta-se como parâmetro desse amor: “como eu vos amei, assim vós deveis amar-vos uns aos outros” (Jo 13,34). A proposta sugerida para o grupo seria o grande sinal da sua ação no mundo, a espiritualidade do amor e da doação. É algo próximo de cada pessoa e com grande possibilidade de ser executado. Este amor, experimentado no cotidiano, revelaria a tradição dos seguidores de Jesus: nisto todos conhecerão que são meus discípulos, se tiverdes amor uns aos outros (Jo 13,35). João descreve o segundo parâmetro do discipulado que está em conjunção com o lava-pés. Jesus pedia: vocês também devem lavar os pés uns dos outros. É o gesto para o mundo. Agora aprofunda: nisto todos conhecerão que são meus discípulos, se tiverdes amor uns aos outros. É testemunho para o mundo.
Servir e amar são elementos de um mesmo processo. Convida à ousadia e à coragem de fazer a diferença no mundo. Junto à Eucaristia, alimento da fé, celebrada naquela noite de quinta-feira, Jesus deixa ao discipulado, o convite a estes dois testemunhos, servir e amar. É a glorificação do amor, força capaz de transformar o mundo.
Fonte: Pe. Ari Antonio dos Reis - Coordenador de Pastoral